9.11.11

Um longo tempo na vida de um homem

Já mais de uma vez mencionei aqui que sou um homem perigoso. Por mais que eu tente me regenerar, acabo ouvindo o chamado do crime novamente. É mais forte que eu.

Foi por isso que me ausentei daqui durante um bom tempo. É que estive na cadeia.

Mas eu confesso o meu crime. Um crime hediondo, eu sei. Fui pego apertando o botão do elevador para descer quando, na verdade, eu ia subir. Os tiras me pegaram e, mostrando os distintivos, gritaram:

- Parado aí!

Naturalmente, eu não me entreguei tão fácil. Corri, corri muito. Direto para a escada rolante. Na correria, não notei que estava subindo pela escada rolante que descia. Ficou fácil para os policiais me alcançarem e, assim, fui para o xadrez.

Foram tempos difíceis. Tempos difíceis. Você sabe o que fazem na cadeia com quem aperta o botão errado do elevador: quando souberam da minha infração, os outros presos me forçaram a usar um boné virado para o lado. Foi terrível.

É que quando você está usando um boné virado para o lado fica difícil ser levado a sério. No almoço, eu pedia uma Coca-Cola sem limão e o agente penitenciário ria da minha cara. Na hora de dormir, eu falava que queria um edredon mais leve na cela e eles não me atendiam. Mesmo meu advogado riu da minha cara quando eu perguntei se ele conseguiria me transferir para uma cadeia mais perto da praia.

O único que me compreendia era o velho Joe “Caolho” Gibson, um preso que estava pagando sua sentença de 189 anos no xilindró – e não deixavam-no morrer antes disso.

Joe “Caolho” Gibson tinha esse apelido porque era surdo de um ouvido e tinha uma grande dificuldade para entender a anatomia humana. Havia sido preso por transportar quinhentos gramas de queijo gorgonzola no banco da frente do carro. De acordo com a lei, o queijo deveria estar no banco de trás e numa cadeirinha adequada. Mas Joe “Caolho” Gibson não ligava para leis.

Joe era o meu parceiro no trabalho forçado: quebrávamos pedras, fazendo pequenas pedrinhas de bingo. Era um trabalho duro, e ficávamos o dia inteiro sob o sol com pesados martelos. Para suportar o sofrimento, cantávamos velhas músicas de prisão, como “Old Alabama”, “Muderer’s Home”, “Midnight Special” e, naturalmente, “Feelings” do Morris Albert.

Por ser o mais antigo do presídio, ele era bastante respeitado e tinha muitas histórias para contar.

Como a de Clark “Caolho” Stewart, que havia construído um túnel para a fuga, mas ficou parado no congestionamento. Ou de Chapman “Caolho” McGee, que tentou encenar Elvis cantando Jailhouse Rock no refeitório da prisão, mas sofreu um grave distensão no polegar do pé direito quando subiu na mesa – e, por conta disso, o diretor do presídio decidiu tirar todas as mesas do refeitório.

Foi com Joe “Caolho” que eu fiz um plano infalível para fugir da prisão. A ideia era nos disfarçarmos de toalhas sujas. Um guarda nos levaria para a lavanderia, de onde seria fácil escapar.

O plano funcionou e hoje sou um homem livre – um fugitivo, é verdade, mas livre. Joe “Caolho” não teve a mesma sorte. Pobre sujeito, usaram amaciante demais nele.

8.11.11

A Felicidade

Felicidade?

Disse o mais tolo: "Felicidade não existe".

O intelectual: "Não no sentido lato".

O empresário: "Desde que haja lucro".

O operário: "Sem emprego, nem pensar".

O cientista: "Ainda será descoberta".

O místico: "Está escrito nas estrelas".

O político: "Poder".

A igreja: "Sem tristeza, impossível. Amém".

O poeta riu de todos, e, por alguns minutos, foi feliz.

Fernando Anitelli