9.11.11

Um longo tempo na vida de um homem

Já mais de uma vez mencionei aqui que sou um homem perigoso. Por mais que eu tente me regenerar, acabo ouvindo o chamado do crime novamente. É mais forte que eu.

Foi por isso que me ausentei daqui durante um bom tempo. É que estive na cadeia.

Mas eu confesso o meu crime. Um crime hediondo, eu sei. Fui pego apertando o botão do elevador para descer quando, na verdade, eu ia subir. Os tiras me pegaram e, mostrando os distintivos, gritaram:

- Parado aí!

Naturalmente, eu não me entreguei tão fácil. Corri, corri muito. Direto para a escada rolante. Na correria, não notei que estava subindo pela escada rolante que descia. Ficou fácil para os policiais me alcançarem e, assim, fui para o xadrez.

Foram tempos difíceis. Tempos difíceis. Você sabe o que fazem na cadeia com quem aperta o botão errado do elevador: quando souberam da minha infração, os outros presos me forçaram a usar um boné virado para o lado. Foi terrível.

É que quando você está usando um boné virado para o lado fica difícil ser levado a sério. No almoço, eu pedia uma Coca-Cola sem limão e o agente penitenciário ria da minha cara. Na hora de dormir, eu falava que queria um edredon mais leve na cela e eles não me atendiam. Mesmo meu advogado riu da minha cara quando eu perguntei se ele conseguiria me transferir para uma cadeia mais perto da praia.

O único que me compreendia era o velho Joe “Caolho” Gibson, um preso que estava pagando sua sentença de 189 anos no xilindró – e não deixavam-no morrer antes disso.

Joe “Caolho” Gibson tinha esse apelido porque era surdo de um ouvido e tinha uma grande dificuldade para entender a anatomia humana. Havia sido preso por transportar quinhentos gramas de queijo gorgonzola no banco da frente do carro. De acordo com a lei, o queijo deveria estar no banco de trás e numa cadeirinha adequada. Mas Joe “Caolho” Gibson não ligava para leis.

Joe era o meu parceiro no trabalho forçado: quebrávamos pedras, fazendo pequenas pedrinhas de bingo. Era um trabalho duro, e ficávamos o dia inteiro sob o sol com pesados martelos. Para suportar o sofrimento, cantávamos velhas músicas de prisão, como “Old Alabama”, “Muderer’s Home”, “Midnight Special” e, naturalmente, “Feelings” do Morris Albert.

Por ser o mais antigo do presídio, ele era bastante respeitado e tinha muitas histórias para contar.

Como a de Clark “Caolho” Stewart, que havia construído um túnel para a fuga, mas ficou parado no congestionamento. Ou de Chapman “Caolho” McGee, que tentou encenar Elvis cantando Jailhouse Rock no refeitório da prisão, mas sofreu um grave distensão no polegar do pé direito quando subiu na mesa – e, por conta disso, o diretor do presídio decidiu tirar todas as mesas do refeitório.

Foi com Joe “Caolho” que eu fiz um plano infalível para fugir da prisão. A ideia era nos disfarçarmos de toalhas sujas. Um guarda nos levaria para a lavanderia, de onde seria fácil escapar.

O plano funcionou e hoje sou um homem livre – um fugitivo, é verdade, mas livre. Joe “Caolho” não teve a mesma sorte. Pobre sujeito, usaram amaciante demais nele.

8.11.11

A Felicidade

Felicidade?

Disse o mais tolo: "Felicidade não existe".

O intelectual: "Não no sentido lato".

O empresário: "Desde que haja lucro".

O operário: "Sem emprego, nem pensar".

O cientista: "Ainda será descoberta".

O místico: "Está escrito nas estrelas".

O político: "Poder".

A igreja: "Sem tristeza, impossível. Amém".

O poeta riu de todos, e, por alguns minutos, foi feliz.

Fernando Anitelli

8.10.11

Eu Não Sei Na Verdade Quem Eu Sou O Teatro Mágico
Eu não sei na verdade quem eu sou
já tentei calcular o meu valor
Mas sempre encontro sorriso e o meu paraíso é onde estou
Por que a gente é desse jeito?
criando conceito pra tudo que restou

Meninas são bruxas e fadas
Palhaço é um homem todo pintado de piadas
Céu azul é o telhado do mundo inteiro
Sonho é uma coisa que fica dentro do meu travesseiro

Mas eu não sei na verdade quem eu sou
Já tentei calcular o meu valor
Mas sempre encontro sorriso
E o meu paraíso é onde estou
Eu não sei... na verdade quem eu sou

Perguntar
Da onde veio a vida
por onde entrei.
Deve haver uma saída
e tudo fica sustentado
Pela fé
Na verdade ninguém
Sabe o que é

Velhinhos são crianças nascidas faz tempo
com água e farinha colo figurinha e foto em documento
Escola! É onde a gente aprende palavrão...
Tambor no meu peito faz o batuque do meu coração

Mas eu não sei na verdade quem eu sou
Já tentei calcular o meu valor
E sempre encontro sorriso... e o meu paraíso é onde estou
Eu não sei na verdade quem eu sou

Perceber que a cada minuto
tem um olho chorando de alegria e outro chorando de luto
tem louco pulando o muro, tem corpo pegando doença
tem gente rezando no escuro, tem gente sentindo ausência

Meninas são bruxas e fadas
Palhaço é um homem todo pintado de piadas
Céu azul é o telhado do mundo inteiro
Sonho é uma coisa que fica dentro do meu travesseiro

Mas eu não sei na verdade quem eu sou
Já tentei calcular o meu valor
Mas sempre encontro sorriso e o meu paraíso é onde estou

Mas eu não sei na verdade quem eu sou...


4.9.11

Sapato novo


Bem, como vai você?
Levo assim calado de lado
do que sonhei um dia
como se a alegria
recolhesse a mão
pra não me alcançar

Poderia até pensar
que foi tudo sonho
ponho meu sapato novo
e vou passear
sozinho como der
eu vou até a beira
besteira qualquer
nem choro mais
só levo a saudade morena
é tudo que vale a pena

Marcelo Camelo

13.8.11

A doce imperfeição

Todo adolescente sofreu com as péssimas escolhas das mulheres. Afinal, você sempre foi o melhor de todas as opções. Mas, por um motivo que vai contra tudo o que ela já disse, aquela admiração, simpatia e compreensão tornavam-se gancho para uma dolorosa amizade que em nenhum momento abria esperanças para uma tarde de quinta-feira de sexo casual.

Todo mundo sabe o valor de uma tarde de quinta-feira pautada pelo sexo casual.

Essas dúvidas têm influência decisiva na transformação do caráter do individuo. Afinal, se sendo um cara atencioso, simpático, educado e cuidadoso ele não conseguiu nada, talvez seja hora de dar preferência a quem é estragado. Não digo que isso seja o ponto crucial para criar uma nova personalidade para o cara. Mas para editar seus gostos, possivelmente.

Nós, homens, temos uma adorável atração por mulheres imperfeitas. Primeiramente porque as perfeitas são artificiais, falsas, recicladas demais. Queremos mulheres realistas, que não achem que o mundo é uma série da Warner, bebem cerveja e que dizem "foda-se". Eu tive uma amiga que era assim. Todo dia que eu a buscava no trabalho ela entrava no carro reclamando de tudo e de todos. Eu achava o máximo isso.

Mas, ok, vamos estabelecer regras. A imperfeição não pode superar o tolerável. Quando revelamos que consideramos isso sexy, estamos tratando de um ar ranzinza, um modo blasé de ver o mundo, o espírito saudosista e até mesmo o tradicional pessimismo. Esse jeitinho irritante tem todo seu charme. Principalmente quando você, no auge da persuasão masculina, canaliza aquela raiva em algo mais relevante...

Essa admiração pela imperfeição feminina que alguns homens possuem tem como origem aquelas decepções do passado. Pode parecer até arrogante apontar problemas ou falhas no perfil de uma mulher, mas, na maioria das vezes, são características admitidas. Elas se acham anti-sociais, chatas e diferentes da maioria.

Mas é tão bom encontrar alguém diferente da maioria.

Isso, hoje, faz todo sentido. As meninas de 13, 14 e 15 anos estavam certas. Eu estava errado. Eu era muito certinho.

E nada é mais bonito na mulher do que a sua imperfeição.

30.5.11

Simplismente faça!

Depois de muito tempo pensando em como fazer isso, finalmente ele tomou coragem. Vestiu-se com sua camisa favorita, a velha calça jeans surrada e o All-Star desbotado. Marcaram de se encontrar no mesmo lugar de sempre. Mas hoje seria diferente. Hoje aquele lugar teria um significado especial.

Ele chegou mais cedo, como de costume. Enquanto ela não aparecia, ele tuitava pelo celular. Não era segredo que estava ansioso. Qualquer um que o visse perceberia. Afinal, há mais de um ano ele vem planejando como fazer isso. Já esteve perto de fazer em outras ocasiões, mas sentia que não era o momento certo.

Quando terminava de mandar um último tweet, olhou para o lado direito e lá vinha ela. Coincidentemente ou não, com a mesma roupa que vestia no dia que se conheceram pessoalmente. A camiseta da banda favorita, a calça jeans desbotada e o All-Star vermelho. A sensação foi a mesma de quando a viu pela primeira vez: era, de fato, a garota da sua vida.

- Tenho que te falar algo…

Os dois disseram a mesma frase, ao mesmo tempo. Essa não era a primeira vez que isso acontecia.

- Fala primeiro. Disse a garota.

Ele respirou fundo. Preparou-se muito pra isso. Não ensaiou. Isso não é algo que se ensaia. As mãos estavam trêmulas, mas ele tentava disfarçar. As pernas bambearam de leve e o coração começou a bater mais rápido. Não dava pra fugir. Era hoje. Tinha que ser hoje. E então ele começou a falar.

- Não tem um jeito fácil de falar isso. Bem, pode até ser fácil pra outras pessoas. Mas você sabe como eu sou. Então, por favor, só escuta. Desde o dia que a gente se conheceu, eu tive certeza absoluta que você era a garota ideal pra mim. Comecei a ter essa certeza enquanto a gente ainda só se falava apenas por internet, mas, depois daquele dia, eu tive certeza. Eu não consigo nem descrever o que senti quando te vi pessoalmente pela primeira vez, só posso dizer que foi algo forte. E se eu me arrependo algo na minha vida, foi de não ter pelo menos tentado te beijar aquele dia. Tem mais de um ano que eu venho tentando te falar o quanto eu gosto de você, o quanto eu quero ficar com você, o quanto você significa pra mim. Tá certo, eu poderia facilitar isso tudo e simplesmente dizer um “quero ficar com você”, mas eu sempre complico as coisas. Então, já que não tenho coragem o bastante pra dizer isso ou simplesmente tentar te beijar… Só queria que você soubesse disso.

Os olhos dela estavam cheios de lágrimas. Ele parecia ter tirado um peso enorme das costas e do coração. Depois de uns dois minutos, ela disse com a voz baixa:

- Por que você só me disse isso hoje? Justamente hoje?

- Porque hoje faz um ano que a gente se viu pela primeira vez.

- Eu também te falei que queria te contar algo.

- Eu sei. O que você queria me contar?

- Estou namorando.

- …

15.5.11

25 anos

Eu já pedi uma bola quadrada de presente

Já joguei Mario Kart.

Cresci vendo sessão da tarde

E vendo Goku salvar o mundo

Torci pelos Cavaleiros do Zodíaco

Ouvia Raimundos com 13 anos de idade

Já vi um padre voar em um balão

Já vi o Lula dizendo que não sabia de nada no esquema do mensalão

Vi Tiririca ganhar uma eleição

Já vi promoção no McDonalds a R$ 5,00

Vi o milésimo gol do Romário

Vi Rick Martin sair do armário

Vi o nascimento da internet pelo mundo

A alegria de milhões de vagabundos

Porque agora se tem pornografia em apenas alguns segundos

Vi Ronaldo machucar o seu joelho

Ser operado e emocionar o país inteiro

E ser pego com 3 travecos em um hotel no Rio de Janeiro

Perdi metade da vida olhando TV

E fui criança que curtia matinê

Meu maior problema da infância era quando meu tamagoshi morria



Texto baseado em um ótimo vídeo que eu perdi o link : )

29.4.11

Videoterapia

A simetria das coisas:


15.4.11

Homem de verdade!

Existem regras que um homem de verdade tem de respeitar. Não falo do gênero humano. Falo dos homens. As mulheres, aí é outra coisa. Mas as mulheres também podem entender o que vou dizer. O que provarei mais abaixo.

Um homem de verdade. Você sabe quando está diante de um pelos amigos dele. Se um homem tem muitos amigos próximos, não há erro: eis uma boa pessoa. Amigos próximos, não amizades.

Um homem de verdade é leal aos seus amigos. O que não significa fidelidade. Um homem pode muito bem passar meses sem encontrar um amigo, e isso em geral ocorre por ele estar ocupado com mulheres. Não tem problema. Eles continuam sendo amigos. Nada vai mudar quando se encontrarem. A lealdade de um amigo não está vinculada à fidelidade. Com as mulheres é o contrário: elas só são leais quando existe fidelidade.

Um homem não fica ressentido com o amigo. Ressentimento é coisa de mulherzinha. Quando há algum problema, o homem chega e diz. De preferência, xingando de antemão:

– Mas tu é um viado mesmo! Como é que tu foi me fazer essa???

Quando um homem tem uma crítica a fazer, ao amigo, ele faz :

– Filho da puta!

Se um homem não pode ir a um encontro com o amigo, não há problema algum em avisar com 15 minutos de antecedência.

– Meu: não vou. Pintou uma gatinha.

– Mas que corno. Tudo bem, vou beber sozinho.

Importante: um homem bebe e se diverte com os amigos. Está presente nas horas boas. Qualquer um pode se fazer presente nas horas ruins, ir a um velório, fazer visita em hospital, mas o amigo é aquele que está sempre pronto a sair e beber e rir com os amigos.

Um homem não omite os defeitos do amigo, exalta-os:

– O Carlos tem pinto pequeno.
Um homem forma a essência da sua personalidade aos 12 anos e não muda mais. É por isso que homens gostam de piadas, de jogar palitinho e de dizer besteira. Um homem de verdade diz besteira.Um homem pode ficar chateado com seu amigo – por cinco minutos. Um homem pode falar mal do seu amigo – na frente dele. Um homem pode até chorar diante de um amigo – desde que não se importe que o amigo o chame de bichinha. Se a sua mulher não gosta dos seus amigos, cuidado: ela não gosta de você.

Um homem de verdade é leal até com seus inimigos. Ciladas são coisas de mulherzinha. Mas uma mulherzinha é diferente de uma mulher de verdade. Uma mulher de verdade sabe, ou intui, que um homem tem de ser como descrevi acima.”


Ótimo texto do Testosterona.

12.4.11

A importância de um oi

Ele em sua camisa forçada, seus 20 e poucos anos, mas com aquele espírito de adolescente, vontade de trocar o cinto apertado e o crachá por uma calça jeans surrada combinando com seu velho All Star e sentindo saudades do seu cabelo cumprido e do tempo que sua maior realização seria uma tatuagem para estampar sua rebeldia.
Hoje trabalhando em uma grande empresa, assumindo o papel de gente grande, ganhando responsabilidades e com medo de crescer tarde de mais.
E Ela. Ela não se sabe. Morena, cabelos lisos bem cuidados e sempre bem arrumada e de ar sério. Mas isso é o que se vê, mas quem seria ela de verdade? Talvez uma simples estudante estagiária, ou quem sabe uma advogada ou até mesmo uma grande executiva. Mas e sua essência? Teria ela também uma porção de dúvidas e incertezas? Seria ela insegura, ou pelo contrário? No alto de seus sapatos seria cheia de si mesma e com a certeza de que poderia conquistar o mundo?
Estaria ela sozinha ou acompanhada? Quem sabe guarda no coração um amor não correspondido.
Mas eles se encontram! Sim. Todas as manhãs, na parade de ônibus, rotineiramente e ás vezes até sentam próximos. Chegam a se pexar também no horário de almoço, já que irônicamente também descem na mesma parada pois trabalham no mesmo prédio. Ele o mesmo sonhador de sempre, mas e ela? Continuamos sem saber.
Dias passaram, talvez até meses, em que aqueles minutos na viagem diária dentro do ônibus eram intrigantes e instigantes.
Até que um dia ela parou de pegar o ônibus. Mudou de emprego? Foi demitida? Promovida? Apenas fazendo outro horário? Quem sabe mudou de cidade?! Também não se sabe! Só se sabe que o sonhador ficou mais uma vez com seus inúmeros sonhos.
Custava ter dado um oi?

23.3.11

O homem que não sabe amar

Os fatores que diferem as reações sentimentais, emocionais e até físicas já foram exemplificados em centenas de livros, filmes e artigos. Psicanalistas explicam que a paixão, quando iniciado, gera uma imagem irreal do parceiro. É algo como o que você sonha com o que ele seja. Com o passar do tempo, e a veracidade explicita e inevitável das personalidades, você vai entendendo que nem tudo são flores. Caso as coisas boas sobressaiam as ruins, o rumo natural é seguido. Se não, um botão eject é acionado e, mesmo que aos poucos, a separação é inevitável.

Essa fase de reconhecimento do território não tem um prazo de atuação. Por mais que isso seja frustrante, não há uma validade ou cronograma exato de ações que farão as coisas terem alguns sentidos. Apenas surge, acontece e passa. Quem vive isso tem um dom: o de amar. É um cara bom, bem intencionado, que vai conhecer, se apaixonar, amar e seguir uma vida recheada de satisfação e amor a família. Esse é o cara limpo. O que um dia já foi sujo, bom, esse dificilmente será corrigido.

O amor dos homens tem um problema bastante serio e único: é absolutamente descartável. O homem ama uma vez. A segurança masculina traça uma linha continua de planos e desejos a partir do primeiro estalo. É quebrado ali um pino de segurança. A paixão deixa o homem totalmente despreparado e suscetível a qualquer acidente no caminho. Basta uma, uma única desilusão para que tudo o que foi aprendido nos filmes da Sessão da Tarde e na música pop inglesa dos anos 80 faça algum sentido: o amor não existe.

Assim surge um novo formato de ser humano. O homem que não sabe amar. Esse homem, assim como citaram psicanalistas maconheiros do século retrasado, é vitima de uma desilusão, apunhalada, traição, mentiras - chame como você quiser -, enfim, de uma sacanagem não literal da incauta que o apresentou ao romance. O homem que não sabe amar sofre de um grave trauma psicológico que gera uma dificuldade enorme de encara relacionamentos logos.

O sofrimento gera monstros. Esse tipo de resultado é capaz de destruir aquilo que foi planejado, desejado e conquistado com o maior esforço do mundo. Não importa o tamanho da satisfação adquirida e convivida com o passar do tempo. Nada supera a dor de um não, a insegurança de uma nova tristeza ou a fraqueza que impede um primeiro passo. O homem utiliza esse sentimento como defesa para evitar um novo desastre. O problema, o maior de todos os problemas, é que essa dor é deliciosamente viciante.

São vitimas do passado obscuro os que preferem o sofrimento de uma paixão incerta e platônica a segurança de um amor garantido e de balões coloridos. Como entender? Não, isso não se explica. E o pior: se explicar perde a graça. As certezas são poucas. Poucas e exclusivas. Ninguém gosta de tocar nesse assunto. Prefere viver e exemplificar em atos o que sente.

Basta observar. A partir de hoje, experimente observar. Cada vez mais o homem não quer um amor para amar. Mas sim, um amor para sofrer.

É na fossa o sentido se faz presente.

22.1.11

Perfeita Simetria

Toda vez que toca o telefone
Eu penso que é você
Toda noite de insônia
Eu penso em te escrever
Pra dizer
Que o teu silêncio me agride
E não me agrada ser
Um calendário do ano passado
Prá dizer que teu crime me cansa
E não compensa entrar na dança
Depois que a música parou
A música parou (parou)
Toda vez que toca o telefone
Eu penso que é você
Toda noite de insônia
Eu penso em te escrever
Escrever uma carta definitiva
Que não dê alternativa
Prá quem lê
Te chamar de carta fora do baralho
Descartar, embaralhar você
E fazer você voltar
Ao tempo em que nada
Nos dividia
Havia motivo pra tudo
E tudo era motivo pra mais
Era perfeita simetria
Éramos duas metades iguais
Ao tempo em que nada
Nos dividia
Havia motivo pra tudo
E tudo era motivo pra mais
Era perfeita simetria
Éramos duas metades iguais
O teu maior defeito
Talvez seja a perfeição
Tuas virtudes
Talvez não tenham solução
Então pegue o telefone
Ou um avião
Deixe de lado
Os compromissos marcados
Perdoa o que puder ser perdoado
Esquece o que não tiver perdão
E vamos voltar aquele lugar
vamos voltar

Ao tempo em que nada
nos dividia
Havia motivo para tudo e tudo era motivo para mais
Era perfeita simetria
Éramos duas metades iguais.

16.1.11

Não ame!

É sério! Afirmo categoricamente: Não Ame!
O que o amor nos traz? Em um primeiro momento ficamos bobos, eufóricos, cheio dos sorrisos. Cumprimentamos os vizinhos mais felizes, os problemas parecem não pesar mais tanto, as horas no trabalho parecem passar mais rápido, o final-de-semana parece ser mais diveritido. Mas e depois? Porque uma hora acaba. É inevitável, afinal o que mais escutamos são histórias de amores imperfeitos, fulminantes que acabaram deixando os envolvidos lastimados, de coração empedrado e isso acaba afetando não só a pessoa, como quem está na volta.
Tudo tem um fim, e o "pra sempre", sempre acaba diria Cassia Eller. Nosso maior erro, é achar, e crer que o amor tem garantias, que ele irá superar todas nossas expectativas e acabamos esquecendo que o relacionamento é composto por pessoas, por seres humanos que são imperfeitos, incostantes e de pensamentos voláteis. E quando uma destas pessoas por "n" motivos resolve mudar seus pensamentos, e suas promessas já não se tornam tão atraentes de cumprir, o encanto acaba e aí vem o sofrimento.
Esse sofrimento que vem junto com uma dor apertada que parece que crava em ti, e toma mais tempo dentro do teu pensamento do que o sentimento que te fazia sorrir antes da outra pessoa acabar. Esse aperto eu diria que é mais forte que o amor, pois é da natureza do ser humano lembrar mais das coisas ruins do que das coisas boas, e o que acaba restando é apenas a experiência de uma relação que não deu certo e a lembrança ruim de uma coisa que supostamente foi boa.
E é aí que chegamos a grande pergunta: Vale a pena? Vale a pena passar por todas situações, se abrir, deixar a outra pessoa saber tudo de ti, fazer parte da tua vida, compartilhar segredos, pra um dia acabar e restar mágoa e um sentimento de que poderia ter sido melhor?
Muitos vão categorizar este texto como amargurado, mesquinho e todos substantivos e qualificações possíveis. Mas acho que estas são pessoas que amam fácil demais, ou que não amaram de verdade, o que no final das contas é mesma coisa.
Voltamos nossas energias para a carreira, para os estudos, para os amigos, familia e tudo mais. Mas a maior parte dos nossos pensamentos e energia, são voltados para o amor, a alma-gêmea, e quando se perde isso, todo o resto fica afetado, por isso eu respondo a pergunta acima com a mesma afirmativa em que comecei este texto: Não vale!

8.1.11

Se escrevo agora, é tão somente para dar notícias de como anda minha saúde – ou melhor, minha doença.

A primeira coisa que posso dizer é que estou vivo – e isso você pode já ter percebido, considerando que estou escrevendo aqui.

A segunda coisa é que não sei ainda por quanto tempo. Talvez uns dias, talvez muitos anos. Isso nós nunca podemos precisar – a não ser que eu escreva um livro ou vire presidente do Senado e, assim, seja nomeado para a Academia Brasileira de Letras.

A terceira coisa que tenho a dizer sobre minha saúde é que a tosse ainda não melhorou. Continuo tossindo constantemente, apesar de estar bebendo litros de xarope diariamente. Do xarope, eu falo logo mais.

O fato é que tenho me medicado. O mais difícil tem sido passar Vick Vaporub nas costas. Tentando fazê-lo, tive uma espécie de torção estranha nos dois braços e nunca mais saí da posição. Desde então, tenho precisado fazer tudo com as mãos nas costas. Literalmente.

É como se eu estivesse algemado. Lembro bem dessa sensação, de quando fui preso por terem me confundido com um sujeito que havia devolvido a fita cassete na locadora sem rebobinar. Colocaram o FBI atrás dele e os agentes pensaram ter sido eu, por conta do começo com a letra "I" no nome: meu nome é Iuri e ele se chamava Ivolanda. Felizmente, tudo foi esclarecido antes que eu fosse para a solitária. As leis quanto à devolução de fitas cassetes não-rebobinadas são sérias.

Mas não é isso que vem ao caso.

Escrever não tem sido difícil. Uso o nariz para as letras e desenvolvi uma técnica para apertar o “shift” com as pontas das orelhas – podendo, assim, digitar as maiúsculas com certa agilidade que o “caps lock” não me permitiria ter.

O chato mesmo é trocar a camisa com as mãos presas atrás. Inexplicavelmente, eu até consigo colocar uma camisa nova. Mas para tirar, só estufando muito o peito e rasgando. Como o Hulk.

Tenho rasgado muitas camisas e agora só me restam umas camisetas de bandas obscura de foxtrot dos anos 30. Aquilo sim é que foi tempo para se viver.

De qualquer modo, os médicos deram um diagnóstico: pode ser escorbuto ou a Peste Negra. Receitaram que eu fosse queimado em uma fogueira, mas eu abri uma exceção nesse caso e resolvi adotar a medicina alternativa.

Tenho tomado bastante chá, mel e deitado meu corpo em brasa. O xamã garantiu que funcionaria melhor que o xarope e o Vick Vaporub. Não é o melhor dos xamãs, mas é o único que o plano de saúde cobre.

Com a tosse, ando pensando muito na minha morte. Quero o Requiem de Mozart no meu funeral. Já encomendei a orquestra para tocar o Kyrie e o grupo cubano para executar o Confutatis – sempre achei que essa parte da obra pedia uma certa malemolência latina.

Também vi recentemente um trecho de o Sétimo Selo e espero, sinceramente, que a Morte não apareça para jogar xadrez comigo. Nunca consegui jogar xadrez, porque acabo irritando o adversário: sempre que movo o cavalo faço o som do galope (“pocotó, pocotó…”) e dizem que isso não é de bom tom.

Mas se ela, a Morte, topar me fazer companhia para uma partida de Imagem & Ação, aí talvez seja uma boa.