5.2.13

Dê uma chance para a paz

Quem me conhece pode dizer uma ou outra coisa a meu respeito: sou míope, cada vez mais gordo e sou um pacifista. Já estive, por exemplo, em uma passeata contra a Guerra do Vietnã. Eu levava um cartaz que dizia “Parem a Guerra do Vietnã” – escrevi eu mesmo, com uma caneta grossa vermelha. O protesto não deu certo: só descobrimos depois que a Guerra do Vietnã já havia terminado em 1975. O protesto foi ano passado.

Além do esforço desperdiçado, apanhei durante a passeata. Não de policiais. Foi um grupo de designers bastante irritados com a entreletra do meu cartaz feito à mão. Eles chegaram soltando bombas de gás lacrimogêneo e nos acertando com réguas.

Mas continuo sendo um pacifista. É o que eu sou, um pacifista. Ainda que o timing absolutamente errado, um pacifista.

Não consigo entender o UFC, por exemplo. Eu sei que as pessoas se empolgam, acompanham, torcem, comentam. Mas todas as vezes em que tentei ver uma das lutas, tudo o que eu pensava era:

“Por que esses dois estão se batendo assim? O que um fez para o outro?”

Tenho certeza de que se eles parassem para conversar, descobririam que não há menor necessidade de toda aquela violência. Não há nada que um bom diálogo não possa resolver.

Foi pensando nisso que eu me inscrevi no UFC, uns tempos atrás. Na época, ainda era chamado de Vale Tudo. E se valia tudo, concluí que também valeria tentar chegar a um acordo amigável com o adversário.

O adversário, na ocasião, chamava-se Renatinho Namastê Paz e Luz. Não parecia ser um sujeito durão, mas soube depois que o apelido era irônico. Renatinho Namastê Paz e Luz tinha um metro e setenta, de um ombro ao outro. E já havia colocado sete adversários em uma cadeira de rodas. A mesma cadeira de rodas. Foi bastante desconfortável.

Soou o gongo e eu comecei a luta tentando oferecer chá para Renatinho Namastê Paz e Luz. Ele, por sua vez, acertou-me um tabefe no lado direito da cara. Derramei todo o chá, manchando o short “Bad Boy” que ele estava usando, o que só o deixou mais irritado. Por isso mesmo, apelei: mostrei-lhe uma foto dos meus três filhos pequenos, na tentativa de despertar-lhe um pouco de simpatia e piedade.

Admito que foi golpe sujo. Eu não tenho filhos. Mas Renatinho Namastê Paz e Luz respondeu com outro golpe sujo: um chute no saco. Sei que eu deveria estar usando protetor, mas é que eu havia ido ao banheiro antes da luta e aquele negócio atrapalhava muito. Acabei tirando e esqueci de colocar de volta.

O protetor de saco estava largado em cima da pia do banheiro, enquanto eu me contorcia no chão. Falei a tal da palavra que representa desistência e encerra a luta de imediato:

- AAAAAAAAAAAIIIIIIIIIIIIIIIIIII, CACETE!!!

O juiz interrompeu o embate, fui direto para o hospital. Mas não me abalei. Continuo um pacifista. Tentei até marcar uma conversa com Renatinho Namastê Paz e Luz, para tentarmos acabar com as nossas diferenças de maneira amigável, mas discordamos seriamente a respeito do lugar do encontro: eu sugeri um bar e ele queria o Octagon. Achei melhor não insistir na discussão e desisti do diálogo. Mandei-lhe um cartão de Natal, no entanto, que voltou completamente estraçalhado pelo Correio. O carteiro tinha um olho roxo e mancava de uma perna, pobre sujeito.

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